O título deste artigo pode parecer bizarro, e uma rápida pesquisa na internet remeter para sites de candidaturas espontâneas a empregos. A verdade é que o título apresentado é acima de tudo uma provocação, porque procura alertar para o tema da gestão documental, seus profissionais, desafios e riscos, face às novas tecnologias.

Na sociedade atual, os negócios são cada vez mais complexos. As empresas lidam diariamente com um enorme volume informação que precisam de tratar e que é gerada por inúmeras fontes. Esta realidade provoca uma elevada procura de profissionais com competências na área da gestão de informação, cujas competências são diferentes dos tradicionais arquivistas.

O desafio atual é que estas pessoas sejam capazes de utilizar as mais modernas técnicas e ferramentas analíticas para suportar a tomada de decisão, garantido conformidade legal e fiscal às organizações.

As competências analíticas destes profissionais, assim como a sua capacidade de recolher, organizar e analisar a informação das organizações, recebidas nos mais diversos suportes – em particular os digitais – traduzem-se num ativo estratégico que lhes permite inovar, desenvolver vantagens competitivas e prever novas tendências de mercado.

A revista Forbes qualificou estes novos profissionais da Gestão de Informação, como a profissão mais sexy do século XXI que a Sociedade da Informação e do Conhecimento fez emergir. A falta de profissionais formados nesta área é tanta que, mesmo em Portugal, os diversos cursos de ciências da informação, de norte a sul do país, anunciam taxas de empregabilidade superiores a 97%.

No entanto, como em quase tudo na vida, também nesta mudança de paradigma existem riscos e não apenas oportunidades. É sobre os riscos que desejo falar.
A mudança de paradigma trazida pela era digital, onde o primado documentalista e custodial (informação e documento são uma só unidade) é posto em causa ao constatar-se que no digital a informação e suporte constituem duas unidades, isto é: o acesso à informação não é imediato, estando dependente de hardware e software, uma realidade que é debatida na preservação digital, onde existem muitas interrogações.

Esta nova perspetiva – pós-custodial – que deu o mote para o nascimento da Ciência da Informação, tem como objeto de estudo a “informação” que resulta da ação sobre os documentos, ou seja, é de natureza social.

A partir daqui toda a arquivística é posta em causa, tal como as suas técnicas e teorias e, logo, a formação dos profissionais.
Os desafios da profissão tradicional de “arquivista” à luz dos desafios da transformação digital, aliados à falta de pessoal nos quadros das empresas detentores de conhecimentos técnicos e específicos em matéria de arquivo, levam a que as equipas multidisciplinares recebam o seu saber e experiência adquirida no que diz respeito ao tratamento do legado histórico ou administrativo dos acervos documentais.

Acima que tudo, porque quando se trata de salvaguardar as questões da integridade, fidedignidade, confidencialidade, etecetera, os conhecimentos destes profissionais fazem toda a diferença.

Bem sei que atualmente negócio e digital são sinónimos, mas grande parte do enquadramento legal e fiscal das organizações ainda tem como primado o suporte da informação papel.

Em conclusão, para evitar uma gestão espontânea da informação recebida e enviada pelas organizações, geralmente potenciada pelo uso indiscriminado de sistemas eletrónicos de gestão documental, temos de, em equipa multidisciplinar e com equilíbrio, analisar os processos e decidir o que é conservado no suporte original, o que pode e deve ser tratado digitalmente, garantido cumprimento de normas legais, fiscais e históricas. Para tal, a presença de um arquivista é fundamental, será ele o gerador de consensos e equilíbrios.

Paulo Veiga, Ceo da EAD

 

(in https://www.empreendedor.com/gestao-espontanea-da-informacao/)